A troca e a exibição de conteúdo pela rede vem alterando nossa relação com as imagens. Tornou-se tão fácil mostrar que o estranho passa a ser não mostrar. Em qualquer comunidade virtual ou serviço de chat, o comum é ver uma imagem icônica e ideal identificando o outro. Em fotologs, blogs, no Orkut, no Multiply, entre tantos outros, os indivíduos constróem suas identidades com a exibição de fotos pessoais. A imagem digital permite a migração das fotografias do álbum de família para o espaço público. Agora, o interesse pela intimidade do outro, incentivado pelos reality shows e pelas redes de comunidades, é acompanhado pelo desejo de ser visto e se diferenciar em meio a tantos outros profiles, objetivo angustiante que volta a estimular o processo.
A relação dos indivíduos com suas fotos pessoais também está mudando na medida em que as máquinas digitais compactas, levadas para qualquer lugar, registram cada momento de todo evento. Parecemos querer alterar “a função moderna da fotografia de atribuir singularidade a um determinado instante. Como lembrar algum acontecimento se o acontecimento é registrado em milhares de fotografias?”, questiona-se a fotógrafa Cláudia Linhares Sanz, em seu depoimento no ciclo de palestras do FotoRio 200sobre o Paradigma Digital.
É como se ao ter tantas imagens acabássemos por não ter nenhuma (nem uma!). Cláudia demonstra essa idéia: “... talvez possa ser dito que quando o número de acontecimentos noticiados é gigantesco, há uma espécie de cancelamento mútuo: todos os fatos são acontecimentos e, ao mesmo tempo, nenhum o é efetivamente.” Seria o incessante fotografar uma contrapartida aos infinitos estímulos que sofremos cotidianamente? A aceleração do tempo contemporâneo naturalmente afeta todos os indivíduos e os desafia a se enquadrar ou ficar à margem de uma sociedade cujos valores máximos são a eficiência e a pressa.
Os questionamentos sobre esse tipo de dinâmica (indivíduo - meio social) são feitos há bastante tempo por teóricos em diferentes áreas; também nas artes visuais e no campo do entretenimento, como o faz Ben Singer, no ensaio “Modernidade, hiperestímulo e o início do sensacionalismo popular”. Refletindo sobre a intensificação das sensações promovidas pelos entretenimentos comerciais à medida que a vida urbana se acelerava na passagem do século XIX para o século XX, ele cita a marca da modernidade reconhecível “no poder do cinema como veículo para transmitir velocidade, simultaneidade, superabundância informacional e choque visceral.” Ele prossegue demonstrando que havia uma contrapartida estética em relação à nova estrutura da vida cotidiana, em termos sociais, econômicos, espaciais e temporais: “O ritmo rápido do cinema e sua fragmentação audiovisual de alto impacto constituíram um paralelo aos choques e intensidades sensoriais da vida moderna”.
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