domingo, 18 de novembro de 2007

A relação com a imagem na ‘sociedade conectada’

A flexibilidade da matriz da imagem digital é levada ao limite com as possibilidades de conexão oferecidas pela internet. A facilidade de disseminação da imagem estática ou em movimento no contexto digital altera a lógica de aplicação desse recurso nos meios de comunicação. A imagem pode estar em qualquer lugar, se repete sem custos, agrega valor estético e de informação, mas a questão digital não se resume à facilidade e à denunciada banalização das imagens, mas também se insere e desempenha papel fundamental no regime de visibilidade e exposição da sociedade contemporânea.

A troca e a exibição de conteúdo pela rede vem alte­rando nossa relação com as imagens. Tornou-se tão fácil mostrar que o estranho passa a ser não mostrar. Em qualquer comunidade virtual ou serviço de chat, o comum é ver uma imagem icônica e ideal identifican­do o outro. Em fotologs, blogs, no Orkut, no Multiply, entre tantos outros, os indivíduos constróem suas iden­tidades com a exibição de fotos pessoais. A imagem digital permite a migração das fotografias do álbum de família para o espaço público. Agora, o interesse pela intimidade do outro, incentivado pelos reality shows e pelas redes de comunidades, é acom­panhado pelo desejo de ser visto e se diferenciar em meio a tantos outros profiles, objetivo angustiante que volta a estimular o processo.

A relação dos indivíduos com suas fotos pessoais também está mudando na medida em que as máqui­nas digitais compactas, levadas para qualquer lugar, registram cada momento de todo evento. Parecemos querer alterar “a função moderna da fotografia de atri­buir singularidade a um determinado instante. Como lembrar algum acontecimento se o acontecimento é registrado em milhares de fotografias?”, questiona-se a fotógrafa Cláudia Linhares Sanz, em seu depoimento no ciclo de palestras do FotoRio 200sobre o Paradig­ma Digital.

É como se ao ter tantas imagens acabássemos por não ter nenhuma (nem uma!). Cláudia demonstra essa idéia: “... talvez possa ser dito que quando o núme­ro de acontecimentos noticiados é gigantesco, há uma espécie de cancelamento mútuo: todos os fatos são acontecimentos e, ao mesmo tempo, nenhum o é efetivamente.” Seria o incessante fotografar uma contrapartida aos infinitos estímulos que sofremos co­tidianamente? A aceleração do tempo contemporâneo naturalmente afeta todos os indivíduos e os desafia a se enquadrar ou ficar à margem de uma sociedade cujos valores máximos são a eficiência e a pressa.

Os questionamentos sobre esse tipo de dinâmica (indivíduo - meio social) são feitos há bastante tempo por teóricos em diferentes áreas; também nas artes visuais e no campo do entretenimento, como o faz Ben Singer, no ensaio “Modernidade, hiperestímulo e o início do sensacionalismo popular”. Refletindo sobre a intensificação das sensações promovidas pelos entrete­nimentos comerciais à medida que a vida urbana se acelerava na passagem do século XIX para o século XX, ele cita a marca da modernidade reconhecível “no poder do cinema como veículo para transmitir veloci­dade, simultaneidade, superabundância informacional e choque visceral.” Ele prossegue demonstrando que havia uma contrapartida estética em relação à nova estrutura da vida cotidiana, em termos sociais, econô­micos, espaciais e temporais: “O ritmo rápido do ci­nema e sua fragmentação audiovisual de alto impacto constituíram um paralelo aos choques e intensidades sensoriais da vida moderna”.

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